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Coluna do Astrônomo

Estrelas de todos os tipos

Quem olha para o céu noturno, especialmente em uma cidade grande como o Rio de Janeiro, dificilmente vai notar as sutis diferenças entre as muitas estrelas. A diferença mais óbvia é a de luminosidade. Mesmo os mais desatentos irão perceber que há estrelas mais brilhantes do que outras. Isso pode ser explicado por dois fatores… O primeiro, bem razoável e pertencente ao senso comum, é a distância de cada uma delas em relação a nós (quanto mais longe, mais fraquinho tende a ser o brilho da estrela). Mas um outro fator existe também, e este talvez não seja do conhecimento de todos: as estrelas são intrinsecamente diferentes entre si.

Numa primeira abordagem (e nossos antepassados realmente fizeram isso), poderíamos pensar que todas as estrelas são iguais. Mas hoje sabemos que não são. Eliminando-se o fator distância (ou, melhor dizendo, imaginando que todas as estrelas estivessem a uma distância igual), realmente veríamos estrelas mais brilhantes e outras nem tanto. De fato, o brilho real de uma estrela é uma de suas características mais fundamentais. Cientificamente, chamamos esta grandeza de “luminosidade absoluta”. Esta informação é tão importante que podemos classificar as estrelas por seu brilho. São as chamadas classes de luminosidade, que vão de I a V. O Sol, que nos parece tão brilhante por estar bem perto de nós, é na verdade uma estrela muito pouco luminosa, de classe V (a classe I é a mais brilhante).

(Não devemos confundir as classes de luminosidade com as classes espectrais, uma outra maneira de classificarmos estrelas. Criada em Harvard, a classificação espectral está intimamente relacionada com a temperatura superficial de uma estrela, o que é a mesma coisa que dizer que está relacionada à sua cor. As classes espectrais são nomeadas com letras, usadas de forma aparentemente aleatória, e vão de O, uma estrela muito quente e azul, a M, uma estrela fria e vermelha. Para se mudar de uma classe a outra gradualmente, usa-se algarismos de 0 a 9. Nessa classificação, o Sol é uma estrela G2.)

Há estrelas que têm brilho variável. Algumas são “falsas variáveis”; fazem parte de um sistema múltiplo que vez por outra abriga um eclipse entre as estrelas, causando uma diminuição aparente no brilho do conjunto. Mas há estrelas que variam de fato, e isso requer uma classificação especial. Geralmente, estrelas variáveis intrínsecas são classificadas em famílias, cujo nome é dado baseado na primeira estrela descoberta daquele tipo. As variáveis Cefeidas têm esse nome porque a primeira estrela deste tipo foi descoberta na constelação de Cefeu. As variáveis Delta Scuti foram batizadas por conta da estrela Delta da constelação do Escudo. E assim por diante.

Se as observações recentes feitas no Chile por um grupo de astrônomos se confirmar, em breve teremos uma nova família de variáveis…

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Coluna do Astrônomo

Quem tem medo de buracos negros?

Quando leio uma notícia relacionada a buracos negros, sempre me pergunto: o que o cidadão médio imagina quando ouve (ou lê) este termo, “buraco negro”?

Minha preocupação se sustenta porque buracos negros não são buracos. E, pasmem, não são negros também! O termo “buraco negro” foi cunhado pelo físico americano John Wheeler, que achava um verdadeiro trava-língua o nome de batismo destes corpos celestes: objetos totalmente colapsados gravitacionalmente.

A ideia de algo que viria a ser chamado de buraco negro remonta ao século XVIII. Naquela época, prevalecia a ideia newtoniana de que a luz era feita de corpúsculos materiais e, portanto, estava sujeita à força da gravidade. Se a luz sofre a influência da gravidade, haveria no Universo um corpo com gravidade tão forte a ponto de não deixar a luz escapar? Este corpo, por definição, não seria visível, pois toda e qualquer emissão luminosa que ele produzisse (ou refletisse) acabaria prisioneira deste campo gravitacional intenso. E como este objeto jamais seria visto, nunca ninguém se preocupou em encontrá-lo!

Em meados do século XIX, Maxwell mostrou que a luz não possuía massa; ela era na verdade uma onda eletromagnética. Isso jogava por terra a hipótese do “buraco negro”. Mas já no século XX, Einstein mostrou que mesmo algo sem massa sofre o efeito da gravidade. A gravidade, segundo a Relatividade Geral, não é uma força, mas sim uma deformação no espaço. A luz, singrando o espaço, acaba desviando de seu caminho original porque este espaço está curvado devido à gravidade. E logo ressurgiu a ideia de um objeto celeste que curvasse o espaço de tal maneira que a luz ficasse aprisionada em uma certa região. Era o ressurgimento do conceito de “buraco negro”.

A Teoria de Evolução Estelar, criada, aperfeiçoada e refinada ao longo do século XX, trouxe à tona a possibilidade de estrelas de grande massa morrerem de forma cataclísmica e, neste processo, terem seus núcleos originais contraídos de tal forma que o espaço em volta deles se fecharia em si mesmo. Isso é exatamente a ideia por trás de um “buraco negro”.

Ou seja, um buraco negro é um objeto astrofísico que se origina através do fim violento de uma estrela de grande massa. Como o Sol e as demais estrelas, ele deve ter formato esférico e certamente não é um buraco. Wheeler cunhou este termo querendo dizer que uma vez que você caísse em um objeto desses, não mais voltaria. Ou seja, seria uma espécie de “buraco sem fundo”.

O “negro” do termo faz alusão ao fato de que a luz não consegue escapar desta atração gravitacional. Ou seja, ele não brilha. Mas Stephen Hawking mostrou que algo pode escapar de um buraco negro, através de complicados processos quânticos. Este fenômeno, conhecido como evaporação de Hawking, faz o buraco negro definhar com o tempo e, eventualmente, desaparecer.

Nas imediações de um buraco negro, coisas interessantes acontecem. Emissões de raios gama e radiação de frenagem são as mais conhecidas. E é assim, observando as imediações, que nós, astrônomos procuramos buracos negros. Que, lembrem-se, não são buracos. Nem tampouco são negros!

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Coluna do Astrônomo

Espectroscopia

Sempre que leio uma notícia deste tipo, me vem à mente uma das perguntas que ouço com mais frequência em meu dia-a-dia, lidando com o público: “como vocês sabem do que é feito uma estrela?”

A Astronomia é a única ciência que não tem à sua disposição os seus objetos de estudo. Nunca fomos a uma estrela, nunca construímos uma em laboratório. Assim, acho mais do que justo que o público leigo nos indague algo deste tipo.

O segredo por trás de tudo chama-se espectroscopia. Este palavrão pode ser entendido como o estudo do espectro eletromagnético emitido por uma determinada fonte. A fonte, no caso, é a estrela que queremos entender. E o que é, afinal, o espectro eletromagnético?

Espectro eletromagnético é a reunião de todos os comprimentos de onda eletromagnética possíveis. Há comprimentos de onda que são captados por nossos olhos. Este subconjunto do espectro é chamado de “luz visível”, e é comumente explicado com uma imagem de um arco-íris. O espectro visível abrange do vermelho (maior comprimento de onda) ao violeta (menor). Imediatamente após o vermelho, temos uma “cor” (comprimento de onda, na verdade) que nossos olhos não veem: é o infravermelho. Isso vale também para o violeta, que tem como “vizinho espectral” o ultravioleta.

Outras “cores” que nossos olhos não veem são, por exemplo, os raios-X, os raios gama, as ondas de rádio e TV e as microondas. As estrelas emitem em todas estas cores, ou melhor, em todos esses comprimentos de onda. E é analise do espectro estelar que nos permite saber do que elas são feitas.

Isso tem a ver, também, com a natureza da matéria. O modelo atômico que usamos ainda hoje é o do “átomo de Bohr”, que representa o átomo como sendo formado por um núcleo central, rodeado por elétrons que giram ao seu redor. O átomo não é exatamente isso, mas este modelo é bom o bastante para explicar os fenômenos observados…

Cada elemento químico tem uma configuração de elétrons diferente. É isso que caracteriza um elemento químico! Assim, cada elemento químico funcionará como uma “peneira” única e inconfundível para a radiação produzida dentro de uma estrela. Logo, ao estudarmos o espectro estelar, conseguimos descobrir quais as “peneiras” pelas quais aquela radiação passou e, portanto, sabemos quais os elementos químicos que existem nas camadas externas daquela estrela.

E é assim que sabemos do que uma estrela é feita! A espectroscopia é um testemunho duradouro da inventividade humana!

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Um novo GPS

Minha paixão pela Astronomia começou a bordo de um navio. Meu primeiro professor foi meu pai, Capitão de Longo Curso, que me mostrou logo cedo ser possível saber sua posição na Terra baseado em observações de estrelas. Na minha mente infantil, aquilo parecia mágica! Apenas olhando aqueles pontinhos de luz, à noite, eu conseguia saber onde estava, no meio de um oceano aparentemente sem fim…

Hoje em dia, a navegação astronômica caiu em desuso. É quase uma arte perdida… E isso se deve, claro, às facilidades trazidas pelo GPS, sigla em inglês para Sistema de Posicionamento Global. Por que fazer observações minuciosas, cronometragens precisas e cálculos de trigonometria esférica se, com um simples toque de um botão, conseguimos nossa latitude e longitude com precisão e acurácia?

O que eu costumo dizer aos meus alunos que me perguntam isso é: o GPS tem dono. E quando digo isso, não estou cometendo uma sinédoque. Na frase anterior, “GPS” não deve ser entendido como “aparelho de GPS”. O termo “GPS” deve ser entendido exatamente pelo que ele é: um sistema de posicionamento global. Ou seja, “o GPS tem dono” quer dizer que o Sistema de Posicionamento Global tem dono!

E quem é o dono desse sistema? Ora, quem? Os Estados Unidos, que colocaram em órbita os satélites que o fazem funcionar de forma tão eficiente. Quando usamos um aparelho de GPS, estamos “pegando carona” em um sistema que não nos pertence.

Lembro-me, na primeira Guerra do Golfo, ter ficado assombrado com a inabilidade de Saddam Hussein em mirar no inimigo. Todos os seus mísseis, invariavelmente, erravam o alvo. Por que isso? Porque os mísseis de hoje não são apontados para os seus alvos a partir de cálculos de movimento balístico (como eram as antigas balas de canhão, por exemplo). Mísseis, hoje, são orientados pelo GPS. Você, em tese, pode apontar um míssil para onde você quiser. Guiado pelo GPS, ele sempre encontrará o alvo. A não ser que…

A não ser que alguém, deliberadamente, introduza um erro sistemático nas coordenadas calculadas pelo GPS, deixando o míssil perdido! E só quem tem o poder de fazer isso são os Estados Unidos, pois o Sistema de Posicionamento Global é controlado por eles.

Cada vez mais o GPS faz parte de nossas vidas e, portanto, cada vez mais ficamos mais dependentes de uma nação específica. A Europa não está muito confortável com essa situação. Por isso, decidiu investir em um sistema semelhante ao GPS, mas independente dele. Será uma nova rede de satélites, que poderá ser acessada assim como é a rede do GPS, e fornecerá ao usuário uma posição geográfica precisa. Esta rede foi batizada de Galileu, em homenagem ao grande cientista italiano.

O Sistema de Posicionamento Galileu (cuja sigla em inglês também é GPS!) sofreu um leve atraso, com o adiamento do lançamento de seus dois primeiros satélites. Mas é um atraso irrelevante, dada a grandiosidade do objetivo.

Logo, logo teremos dois GPSs! Quem sabe a China não lança um terceiro?

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A Rússia e o Espaço

Em julho deste ano, tive a oportunidade, por ocasião de um congresso, de conhecer a Rússia. Diferentemente da maioria dos turistas, não fui a São Petersburgo. Fui, isso sim, a Nizhny Novgorod, cidade industrial que, no folclore daquele país, é descrita como “o bolso da Rússia” (Moscou é a cabeça e São Petersburgo é o coração).

Não é de se espantar que eu tenha conhecido vários russos em minha estadia por lá, a maioria trabalhando em Astronomia e Educação. Em dado momento, pude acompanhar uma conversa que, a mim, soou surreal. Era um russo e um americano discutindo quem havia, de fato, ganho a Corrida Espacial durante a Guerra Fria. Surreal, pois o russo insistia que a vitória era americana, enquanto que o americano afirmava que a Rússia havia ganho!

Todos sabemos que os russos enviaram o primeiro satélite (Sputnik, 1957) e o primeiro homem (Gagarin, 1961) ao espaço. Se respeitarmos a definição do termo “corrida”, é óbvio que os russos ganharam! Mas se preferirmos chamar a Corrida Espacial de Conquista Espacial, quem de fato levou a melhor? Difícil saber… A NASA (agência espacial americana) mandou homens à Lua; a Rússia bateu recordes de permanência no espaço.

Hoje, com as sucessivas crises econômicas que afligem a Rússia (já há bastante tempo) e também os Estados Unidos (que recentemente encerrou seu programa de ônibus espaciais), nossos olhos se voltam para a China, e aparentemente a corrida, ou a conquista, ainda não acabou e, portanto, é cedo para declararmos um vencedor.

Mas por que estou falando dessas coisas? Falo disso porque li recentemente que a Rússia se propõe a prolongar a vida útil da ISS, sigla em inglês que designa a Estação Espacial Internacional. A iniciativa russa recebeu imediatamente o apoio do diretor de operações da NASA, e dos representantes da Agência Espacial Europeia (ESA). Não é pra menos: graças à MIR, a famosa estação espacial russa, ninguém entende deste tipo de construção tão bem quanto os russos.

Longa vida à ISS. Prolongada, de preferência…

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O Horário de Verão

Começa domingo o Horário de Verão.

Não vou aplaudir, nem tampouco menosprezar, aqueles que reclamam dessa prática, dizendo que faz mal ao organismo. Filho de um Capitão de Longo Curso, já viajei ao redor do mundo o suficiente pra saber que ajustes de fuso horário não matam ninguém!

Não concordo nem discordo dos que dizem que a economia é irrisória; não tenho dados estatísticos para isso.

Falo apenas àqueles que atacam o Horário de Verão usando o argumento aparentemente imbatível de que ainda estamos muito longe do verão e, portanto, é errado adotar o Horário de Verão em pleno mês de outubro…

Com essas pessoas, me solidarizo no fato de que o nome desta prática foi muito mal escolhido. Embora a Europa, nosso primeiro modelo de civilização e cultura, adote esta prática sob o nome de “European Summer Time”, em seus vários idiomas (“horário de verão europeu”), nos Estados Unidos, que nos têm servido de ícone cultural no passado recente, este procedimento é conhecido como “Daylight Saving Time”, ou seja, “horário econômico da luz do dia”.

Poderíamos resumir este nome para Horário Econômico. Sim, pois estamos ainda há meses do verão! Então porque o Horário Econômico, ou Horário de Verão (nome oficial), começa agora?

Na verdade, a pergunta certa é anterior a esta: por que o verão começa em 21 (ou 22) de dezembro? Eu explico: neste dia, observamos um dos solstícios. São dois, ao longo do ano: um em junho e outro em dezembro. E o que exatamente são os solstícios?

Nossos antepassados, os primeiros astrônomos, observaram que o Sol nasce em diferentes pontos do horizonte ao longo do ano. (Sim, é verdade! O Sol não nasce sempre no ponto cardeal leste!) Nos dias de equinócio (dois também, em março e setembro), o Sol nasce exatamente no ponto cardeal leste. Logo após o equinócio de setembro, o Sol começa a nascer mais para o sul. A cada dia que passa, o Sol vai nascendo mais afastado do leste, sempre em direção ao sul. Até que um dia este afastamento é máximo, ou seja, o sol para de se afastar. No dia seguinte, o sol começa a voltar em seu caminho, se aproximando do leste novamente, até atingi-lo mais uma vez no dia do equinócio de março. Após o equinócio de março, o sol começa a se afastar rumo ao norte. Atinge também seu máximo afastamento, no solstício de junho, e volta, rumo ao leste, que será atingido no equinócio de setembro. E o ciclo se repete, ano após ano…

Os dias em que o Sol para de as afastar foram chamados de solstícios, uma corruptela de “sol estático”, ou “sol parado”. No solstício de dezembro, temos o máximo afastamento angular do Sol, rumo ao sul. Ou seja, o dia de solstício de dezembro é o dia em que o hemisfério sul receberá o máximo de insolação.

Do ponto de vista astronômico, levando-se em conta única e exclusivamente a quantidade de luz e calor que a Terra recebe do Sol, o solstício de dezembro deveria ser o auge do nosso verão, e não o seu começo. Assim sendo, como o Horário de Verão está preocupado tão somente com a quantidade de luz solar que chega até nós, seu auge (seu meio) deve ser justamente o dia do solstício.

Assim, é correto começar o Horário de Verão em outubro (antes de o verão começar) e terminá-lo em fevereiro (antes de o verão terminar).

Gostar ou não do Horário de Verão é direito de cada um. Só não vale dizer que ele está errado por começar antes do verão…

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Galáxias Primordiais

Nos domínios da Astronomia, há uma corrida saudável entre teóricos e observacionais. “Observacional” é o jargão que usamos para nos referirmos aos cientistas que têm nas observações o cerne de suas pesquisas; os teóricos, por outro lado, se concentram mais em equações, fórmulas e hipóteses. É o casamento das duas abordagens que faz a ciência avançar. Mas, como eu já disse, há uma corrida entre ambos os métodos.

Essa corrida acontece na Física, também. E, às vezes os teóricos chegam na frente, postulando algo que nunca foi visto. Aconteceu na década de 1930, por exemplo, quando Paul Dirac, resolvendo equações da Mecânica Quântica, afirmou que haveria algo que, por falta de nome melhor, foi batizado de antimatéria. Apenas dois anos depois, Carl Anderson descobriu partículas de antimatéria em laboratório.

De volta à Astronomia, às vezes são os observacionais que vencem a prova. Em 1999, observações constataram que o Universo está se expandido de forma acelerada. Até hoje não há uma teoria completamente satisfatória que explique este fato!

E nesta corrida, os observacionais têm uma arma poderosa: o avanço rápido da tecnologia. Novas técnicas de observação, novos métodos de depuração de resultados, novos materiais, tudo isso contribui para o avanço de novas descobertas.

Como agora, por exemplo. Um supertelescópio situado nas Ilhas Canárias nos traz novidades sobre as galáxias primordiais. Aparentemente, elas não são tão densas quanto se pensava. E isso impacta diretamente em como imaginamos que elas tenham evoluído.

Parece que os observacionais ganharam mais uma!

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A.L.M.A.

 

A ciência já foi acusada, algumas vezes, de não ter alma… Esse eufemismo, na minha humilde opinião, é até um elogio. A ciência realmente não deve ter alma. Nem coração. A ciência deve ser desprovida de paixões. A ciência deve se preocupar tão somente com o entendimento da realidade.

Cientistas, por outro lado, estão livres para exercer suas paixões e suas vontades. Para atuar em prol de suas idiossincrasias. Mas os cientistas são muitos e, na média, em grande escala, estas paixões se cancelam, resultando em uma ciência imparcial e livre de ardores. Uma ciência sem alma…

Mas eis que agora a Astronomia e os astrônomos podem bater no peito e gritar: “Sim, nós temos ALMA”. Escrito assim, com letras maiúsculas, o termo é um acróstico em inglês que quer dizer “Atacama Large Milimeter-submilimeter Array”, ou “Grande Rede Milimétrica-submilimétrica do Atacama”.

Atacama, sabemos, é um deserto localizado no Chile. É lá que temos o melhor céu do mundo, no que se refere às condições para observação astronômica. Lá é seco (sem umidade), alto (pouca atmosfera no meio do caminho) e longe de qualquer cidade (sem poluição luminosa).

O “M” do nome se refere ao tamanho do comprimento de ondas que este instrumento está preparado para captar. São ondas milimétricas e submilimétricas, na faixa das ondas de rádio. Os astros emitem em diversos comprimentos de onda, mas a nossa atmosfera filtra a maior parte deles. As duas grandes “janelas” atmosféricas são para as ondas visíveis e as ondas de rádio. Assim, só faz sentido construir telescópios terrestres que “enxerguem” no visível o no comprimento das ondas rádio. O ALMA enxerga ondas de rádio; é um rádio-telescópio.

Por fim, chegamos ao “large array”, a “grande rede” em português. Um rádio-telescópio típico tem a forma de uma antena parabólica. As ondas de rádio refletem na superfície parabólica e se concentram no foco do instrumento, onde há um receptor. Quanto maior a antena, mais ondas ela capta e mais detalhes teremos para analisar.

Em um exercício criativo de engenharia, as rádio-antenas começaram a ser construídas em conjuntos, ou arrays, de modo que cada uma seja responsável por receber um “pedaço” da informação. Todos os “pedaços” são “colados” por um algoritmo de computador e a imagem final obtida é a equivalente a que se conseguiria com uma antena única muito maior.

O ALMA, quando estiver em pleno funcionamento, reunirá nada menos que 66 antenas! Uma “grande rede” de fato. Sua estreia foi ontem, com apenas 12 antenas em funcionamento. E as imagens obtidas já são espetaculares!

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Um planeta, dois sóis

 

Meu último comentário aqui neste espaço se referia ao sistema planetário ao redor da estrela Kepler-19 (uma estrela com dois planetas). Agora leio sobre a Kepler-16, um sistema binário ao redor do qual foi descoberto um planeta. Sim, é isso mesmo. Um planeta ao redor de duas estrelas!

Levando-se em conta que a órbita é algo que decorre de um equilíbrio gravitacional, há muitas e muitas possibilidades de um sistema deste se desenvolver. Uma estrela binária, ou melhor, um sistema duplo de estrelas é exatamente isso: duas estrelas que se orbitam entre si, girando ao redor de um centro de massa comum.

Como as estrelas têm, geralmente, massas de grandeza comparável, este centro de massa comum fica fora de qualquer uma delas. Ou seja, ambas as estrelas giram ao redor de um ponto no espaço vazio!

Se por alguma obra do destino conseguíssemos colocar neste ponto de equilíbrio uma massa qualquer — um planeta, por exemplo — ela lá ficaria, em perfeito equilíbrio. Obviamente, tal configuração, de tão improvável, é impossível.

Uma outra solução dinâmica interessante seria se o planeta em questão fizesse uma espécie de figura “8”, com cada estrela ao centro de uma das voltas da figura. Tal solução traria instabilidades gravitacionais ao planeta e sua mais do que provável destruição devido às próprias forças de maré.

A solução estável, observada em Kepler-16, é a mais simples. A órbita do planeta é externa a ambas as estrelas. Isso torna o sistema muito parecido com o sistema Sol-Terra. Só que, ao invés de uma, há duas estrelas. Neste planeta (o Kepler-16b), devido a sua própria rotação, o Sol nasce e se põe. Mas são dois sois, e não apenas um!

Que belo espetáculo isso não deve ser…

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Descoberta de planetas por inferência

Leio na internet que um novo planeta extrassolar foi descoberto pelo satélite Kepler. A própria notícia começa dizendo que não há nada demais nisso, pois o satélite Kepler foi colocado em órbita justamente para descobrir novos exoplanetas.

Então o que é noticia nesta história? Segundo o G1, a grande notícia é que este planeta não foi visto, e sim inferido. Sua existência foi calculada a partir de perturbações observadas na órbita de um outro planeta.

A sonda Kepler já havia descoberto, ao redor de uma estrela situada a cerca de 650 anos-luz daqui, na constelação de Lira, um planeta. A estrela foi batizada de Kepler-19 e o planeta, Kepler-19b. Agora esta nova descoberta nos traz o Kepler-19c, segundo planeta em órbita desta mesma estrela.

E, novamente, segundo o G1, a grande novidade é que o Kepler-19c não foi visto. Sua existência foi calculada matematicamente a partir de inconsistências encontradas na órbita do Kepler-19b.

Esse tipo de inferência é antigo na astronomia e foi graças a ele que o planeta Netuno foi descoberto em 1846. Sua massa causava uma perturbação na órbita de Urano, descoberto em 1781. Astrônomos inferiram a existência de um oitavo planeta no nosso Sistema Solar, e calcularam sua possível localização, baseados nesta perturbação.

Fizeram isso novamente agora, inferindo a existência do Kepler-19c, baseados em perturbações medidas na órbita do Kepler-19b. De fato, como diz a manchete, o planeta foi descoberto sem ter sido observado! (Mas isso já havia sido feito com Netuno, em 1846…)

A pergunta que faço é: o planeta Kepler-19b foi observado? A resposta é não! Sua descoberta também é uma inferência, baseada não em dados gravitacionais, mas de luminosidade. A esmagadora maioria dos planetas extrassolares não foi observada. A existência destes objetos é geralmente inferida a partir de dados indiretos.

No caso do Kepler-19b, percebeu-se que a luminosidade da estrela caía um pouco de tempos em tempos (nada que possa ser percebido sem instrumentos de alta precisão). Esta diminuição do brilho é explicada como o trânsito de um objeto sem brilho próprio. Ou seja, algo que não tem luz própria, de forma periódica, passa em frente à estrela e ofusca minimamente seu brilho. O que poderia ser? Um planeta em órbita!

Apesar de estar feliz com mais esta vitória do satélite Kepler, não creio que a noticia seja “a descoberta de um planeta que não foi visto”. Do ponto de vista da Astronomia, este tipo de descoberta já não é mais novidade!