Descoberta de planetas por inferência
Leio na internet que um novo planeta extrassolar foi descoberto pelo satélite Kepler. A própria notícia começa dizendo que não há nada demais nisso, pois o satélite Kepler foi colocado em órbita justamente para descobrir novos exoplanetas.
Então o que é noticia nesta história? Segundo o G1, a grande notícia é que este planeta não foi visto, e sim inferido. Sua existência foi calculada a partir de perturbações observadas na órbita de um outro planeta.
A sonda Kepler já havia descoberto, ao redor de uma estrela situada a cerca de 650 anos-luz daqui, na constelação de Lira, um planeta. A estrela foi batizada de Kepler-19 e o planeta, Kepler-19b. Agora esta nova descoberta nos traz o Kepler-19c, segundo planeta em órbita desta mesma estrela.
E, novamente, segundo o G1, a grande novidade é que o Kepler-19c não foi visto. Sua existência foi calculada matematicamente a partir de inconsistências encontradas na órbita do Kepler-19b.
Esse tipo de inferência é antigo na astronomia e foi graças a ele que o planeta Netuno foi descoberto em 1846. Sua massa causava uma perturbação na órbita de Urano, descoberto em 1781. Astrônomos inferiram a existência de um oitavo planeta no nosso Sistema Solar, e calcularam sua possível localização, baseados nesta perturbação.
Fizeram isso novamente agora, inferindo a existência do Kepler-19c, baseados em perturbações medidas na órbita do Kepler-19b. De fato, como diz a manchete, o planeta foi descoberto sem ter sido observado! (Mas isso já havia sido feito com Netuno, em 1846…)
A pergunta que faço é: o planeta Kepler-19b foi observado? A resposta é não! Sua descoberta também é uma inferência, baseada não em dados gravitacionais, mas de luminosidade. A esmagadora maioria dos planetas extrassolares não foi observada. A existência destes objetos é geralmente inferida a partir de dados indiretos.
No caso do Kepler-19b, percebeu-se que a luminosidade da estrela caía um pouco de tempos em tempos (nada que possa ser percebido sem instrumentos de alta precisão). Esta diminuição do brilho é explicada como o trânsito de um objeto sem brilho próprio. Ou seja, algo que não tem luz própria, de forma periódica, passa em frente à estrela e ofusca minimamente seu brilho. O que poderia ser? Um planeta em órbita!
Apesar de estar feliz com mais esta vitória do satélite Kepler, não creio que a noticia seja “a descoberta de um planeta que não foi visto”. Do ponto de vista da Astronomia, este tipo de descoberta já não é mais novidade!