A dieta do buraco negro central
Por Jorge Marcelino – Astrônomo da Fundação Planetário da Cidade do Rio de Janeiro
Poucos meses após Albert Einstein ter publicado seu artigo sobre a Teoria da Relatividade Geral, o astrônomo prussiano Karl Schwarzschild, servindo na frente russa durante a I Guerra Mundial e sofrendo de uma doença de pele rara chamada pênfigo, publicou três artigos fundamentais para a Física e a Astronomia: dois com soluções exatas sobre a Relatividade Geral e um sobre a Teoria Quântica de Planck.
O artigo sobre o campo gravitacional de uma massa “pontual” e esférica levou ao desenvolvimento da métrica de Schwarzschild e, com isto, à teoria sobre buracos negros, sua singularidade e o seu horizonte de eventos.
Em 11 de maio de 1916, pouco tempo depois dos seus resultados manuscritos terem sido elogiados e apresentados por Einstein em uma reunião acadêmica, Schwarzschild faleceu vítima de sua doença de pele rara, doença esta em que o sistema imunológico ataca a própria pele causando bolhas dolorosas. Perdeu-se um gênio, que foi considerado em 1960 como o maior astrônomo dos últimos 100 anos.
A teoria, juntamente com o desenvolvimento de novos detectores, permitiu a descoberta e a compreensão dos buracos negros e suas implicações na origem e desenvolvimento das galáxias. Sabemos hoje que os núcleos galácticos são habitados por estes fabulosos objetos.
A nossa galáxia, a Via Láctea, durante anos teve a presença de um buraco negro em seu centro como algo controverso. A ausência de um tipo específico de radiação e outros indícios característicos causava discussões acaloradas sobre o assunto. Porém, o trabalho de 16 anos de observação de astrônomos alemães nos telescópios do Observatório Europeu do Sul (ESO) mostrou a presença de um grande buraco negro com quatro milhões de massas solares. Utilizando uma compilação de imagens, conseguiu-se mostrar a dinâmica de 28 estrelas ao redor do objeto. (Ver vídeo)
Observações do telescópio espacial Herschel encontraram uma gigantesca nuvem de gás que está orbitando o buraco negro central e poderá ser absorvida por ele. Pela primeira vez foi possível detectar separadamente a emissão do buraco negro da emissão da nuvem quente de gás que o circunda.
A maior surpresa desta descoberta vem da temperatura encontrada na nuvem de gás, cerca de 1.000ºC, muito superior às encontradas normalmente, por volta de poucas dezenas de graus acima do zero absoluto. Esta alta temperatura poderia ser explicada pelo choque causado pelo movimento acelerado dentro da própria nuvem ou da ruptura de estrelas próximas que estariam sendo destruídas pela grande gravidade do buraco negro. (Veja este outro vídeo sobre o buraco negro e a sua interação com a nuvem de gás (em inglês).
Uma das piadas feitas pelos pesquisadores é que o buraco negro do centro da Galáxia está cozinhando e irá se alimentar deste gás (ele não gosta de alimento cru!). Espero que possamos, em breve, confirmar estas suspeitas através das observações.