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A Beleza dos Números

Todas as curvas, linhas e desenhos em geral, feitos em uma folha de papel, possuem uma regra básica responsável por sua forma e coerência. Muitos conhecem esta regra pelo nome de equação (uma palavra que costuma causar tremores na maioria da população). Uma equação nada mais é do que uma frase escrita em um idioma – Matemática – que descreve o que está sendo visto ou traçado. Assim, posso dizer que uma circunferência é “o lugar geométrico composto por todos os pontos que estão a uma mesma distância (o raio) de um certo ponto em particular (o centro)”. Ou posso dizer que a circunferência é x2 + y2 = r2. A frase matemática é muito mais breve e sucinta do que a escrita em português, ainda que nem todos consigam entendê-la.

Agora, se uma figura pode ser escrita matematicamente, seria justo tentarmos descrever o impressionismo de um Monet ou o surrealismo de um Dali usando esta linguagem? Mais importante ainda, seria possível? Para a segunda resposta, eu diria que sim. É isso que, por exemplo, faz um computador (uma máquina sabidamente burra) ao scannear uma imagem. Ele cria uma espécie de equação para cada um de seus pixels, determinando tonalidades, contrastes e brilhos, reunindo todas estas equações em um grande sistema que forma a imagem na tela. Acho, no entanto, que escrever estas equações todas por extenso (num imenso conjunto de tais frases matemáticas – uma redação) não seria viável. (Da primeira pergunta, covardemente me abstenho, já que definitivamente meu ponto de vista não é neutro e, portanto, eu seria um péssimo juiz.)

Ainda neste tópico, seria necessária tal empreitada? O que lucraria a arte se pudéssemos transcrever com números suas obras-primas? (E aqui, basta lembrarmos que as esculturas são sólidos – figuras de três dimensões -, as melodias são combinações de um conjunto finito de notas e os livros são compostos por apenas 26 letras ordenadas segundo certos parâmetros para vermos que de fato estamos falando de variadas formas de expressão artística.) O que ganharíamos nós? Globalmente, acho que nada (mas confesso que eu, em particular, ficaria bastante feliz).

Poderíamos, com isso, quantificar o conceito de beleza? Ou, como diz o ditado, “quem ama o feio, bonito lhe parece”? Ambas as perguntas podem ser respondidas afirmativamente. Se tomarmos o ideal generalizado de beleza como padrão, poderemos quantificá-la, medi-la e compará-la. Decomponha-se matematicamente uma bela paisagem, uma linda mulher ou uma agradável canção e teremos uma régua calibrada para medirmos tudo o mais que quisermos. Mas, uma vez que nossa régua deu seu veredito, vale a pena olharmos com nossos olhos para decidir: “isso é mesmo bonito?”. A resposta a isso é uma questão pessoal e, há muito já se sabe, gosto não se discute.

Mas falávamos de números. Os números são os blocos primários que usamos nos dias de hoje para entender a natureza que nos cerca. Os números nos permitem entender a proliferação de uma praga em um cafezal, otimizar vacinas, ganhar os céus em pesadas máquinas, imaginar o interior das estrelas, vislumbrar o futuro do Universo. A Matemática traduz conceitos físicos, astronômicos, biológicos, químicos e sociais, ainda que nos dias de hoje ela possa parecer uma linguagem arcana e misteriosa, dominada por uma pequena confraria sinistra que se distancia cada vez mais da população. A ciência, em geral, parece mágica. Parece, apenas.

Estamos ainda muito longe do entendimento do todo, mas caminhando, devagar e sempre, rumo a uma direção desconhecida, um destino fugidio que ora se revela em sua plenitude, ora se esconde maliciosamente. E cada novo passo, trêmulo ou firme, só pode ser dado com o auxílio dos números e toda a bagagem que eles carregam.

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