Primeira Foto dos Limites de Um Buraco Negro
A publicação feita hoje da primeira foto de um buraco tem por trás uma história que nos faz refletir sobre: o poder humano de conhecer cada vez mais a natureza; o poder da arte em representar a natureza, mesmo com relação a algo que não tenha sido observado ou experimentado pela ciência; e o poder de acreditarmos em nossas próprias ideias quando sentimos que são válidas, por mais impossíveis que possam parecer a outras pessoas.
Em 1993 o doutorando Henio Falcke percebeu que um certo tipo de emissão de rádio, intensa o suficiente para ser capturada da Terra, seria gerado nos limites de um buraco negro. Não lhe deram muitos ouvidos. Ele também foi marcado por um artigo de 1973 que dizia que um buraco negro poderia parecer duas vezes e meia maior que seu tamanho real devido ao efeito da forte gravidade. Essas duas hipóteses fizeram com que Falcke acreditasse que seria mesmo possível observar os limites de um buraco negro. Foram 20 anos de defesa de suas ideias até conseguir o patrocínio que mostraria que ele estava certo.
A região que marca os limites de um buraco negro é chamada horizonte de eventos. Esse é o ponto que, se ultrapassado, não há mais volta. Buraco negro é um objeto que nasce quando uma estrela muito massiva morre (é possível também que existam os buracos negros primordiais, formados logo após o big-bang). Inicialmente chamados de objetos gravitacionalmente colapsados, os buracos negros são definidos como objetos cuja gravidade não permite nem que o ente com a maior velocidade na natureza, a luz, consiga escapar. Esse efeito de “entra e não sai” acontece com qualquer coisa que cruze o horizonte de eventos.
As imagens mostram gás interestelar caindo no horizonte de eventos. As imagens que resultaram nesta já clássica fotografia da Astronomia moderna foram obtidas pelo Event Horizon Telescope (do inglês Telescópio de Horizonte de Evento), um conjunto de oito observatórios espalhados na Terra que, juntos, funcionam como um enorme telescópio único.
O buraco negro observado tem 40 bilhões de quilômetros de diâmetro e está na galáxia M87, localizada a 55 milhões de anos-luz de nós, na constelação da Virgem. Sua massa é 6,5 bilhões de vezes a massa do Sol. Não foi à toa que Falcke o classificou como “um monstro”.
Notem que observar esse buraco negro tão distante foi mais fácil que observar o buraco negro que existe no centro de nossa própria galáxia. A Astronomia é uma ciência que lida muito com dificuldades observacionais e, de vez em quando, o que está mais próximo não está exatamente nas melhores condições de observação.
Buracos negros foram primeiro descobertos numa folha de papel, como solução para equações da relatividade geral, a teoria de Einstein, que descreve o Universo como sendo formado por uma malha onde espaço, tempo, energia e matéria estão interligados e não são coisas independentes.
Bom, uma solução como aquela poderia ser apenas um exercício matemático, mas a natureza poderia não ser capaz de produzir um espaço como aquele, com tanta gravidade que nem a luz poderia escapar. Até que, algumas décadas depois, a Astrofísica mostrou que o colapso estelar que antecede a explosão de uma supernova poderia de fato produzir um buraco negro.
Após isso foram observadas diversas situações que sugeriam a presença de um buraco negro, como jatos de matéria emitidos do centro de galáxias e até material espiralando para um provável buraco negro. Mas observar exatamente o horizonte de eventos desses misteriosos objetos era algo inacreditável.
Após o horizonte de eventos, nada escapa. O tempo para. Nada se move. O que isso significa exatamente? Não sabemos… Mas conseguimos chegar um pouco mais perto de um dos segredos da natureza, perto o suficiente para darmos uma olhadinha. E isso graças a um conjunto de tecnologias que nos permite tanto a tomada de dados da natureza quanto o processamento desses dados.
E algo ainda nos chama a atenção nessa imagem do horizonte de eventos: ela é idêntica à maioria das representações artísticas feitas para representar um buraco negro. Como eles não emitem luz, desenhar um buraco negro é muito difícil. Normalmente, em figuras ou mesmo no cinema, a representação é feita se utilizando a luz que estaria sendo emitida no horizonte de eventos.
O que a arte nos mostrou é muito próximo do que a ciência agora nos revela, graças à utilização saudável de nossos avanços tecnológicos e à perseverança de um homem que soube seguir seu instinto desde a época de estudante.
Leia Mais: BBC – First ever black hole image released (em inglês), CNN-This is the first photo of a black hole (em inglês)