Usamos cookies em nosso site para lhe dar a experiência mais relevante, lembrando suas preferências e repetindo visitas. Ao clicar em "Aceitar tudo", você concorda com o uso de TODOS os cookies. No entanto, você pode visitar "Configurações de cookies" para fornecer um consentimento controlado.

Visão geral da privacidade

Este site usa cookies para melhorar sua experiência enquanto você navega pelo site. Destes, os cookies categorizados conforme necessário são armazenados no seu navegador, pois são essenciais para o funcionamento das funcionalidades básicas do site. T...

Sempre ativado

Os cookies necessários são absolutamente essenciais para que o site funcione corretamente. Esta categoria inclui apenas cookies que garantem funcionalidades básicas e recursos de segurança do site. Esses cookies não armazenam nenhuma informação pessoal.

Quaisquer cookies que podem não ser particularmente necessários para o funcionamento do site e são usados especificamente para coletar dados pessoais do usuário através de análises, anúncios, outros conteúdos incorporados são denominados como cookies não necessários. É obrigatório obter o consentimento do usuário antes de executar esses cookies em seu site.

Categories
Coluna do Astrônomo

Pesquisa aponta desaceleração da expansão do Universo

Comentário do Astrônomo Alexandre Cherman à “Pesquisa aponta desaceleração da expansão do Universo”

Em Cosmologia, a parte da ciência que estuda o Universo, tudo o que temos são modelos teóricos. E como qualquer teoria, estes modelos são construídos a partir de hipóteses que, uma vez comprovadas, fortalecem a suposição original, em um ciclo virtuoso que cria paradigmas científicos.

Vez por outra algo é descoberto que não se encaixa no modelo vigente. Passado o embaraço inicial, astrônomos, físicos, matemáticos e cosmólogos em geral correm às pranchetas e tentam ajustar seus modelos. Podem fazer isso descartando hipóteses consagradas e/ou criando novas a partir do nada, que servem apenas para explicar o que se acaba de observar (as famosas “hipóteses ad hoc”).

Um exemplo recente disso aconteceu em 1999, quando observações de Supernovas do tipo Ia, feitas por diferentes grupos de pesquisadores, apontaram para um resultado surpreendente: a expansão do Universo estava se acelerando.

Que o Universo estava em expansão, isso já sabíamos desde 1929, graças ao astrônomo Edwin Hubble. E desde aquela época pensávamos que esta expansão fosse cada vez menor, visto que a gravidade dos objetos — o poder de atração entre eles — tenderia a frear esse movimento universal.

Pois em 1999 descobrimos que não só a gravidade não freia o Universo, mas há algo que não sabemos o que é acelerando a expansão. Ou não…

Os resultados obtidos com as observações de Supernovas do tipo Ia apontavam para isso. “Isso”, no caso, estava baseado em um modelo que explica como as Supernovas do tipo Ia explodem e também em como a luz cruza o Universo. Nenhuma destas hipóteses foi revisada. Preferiu-se revisar o conceito de que a gravidade é a única força de alcance quase-infinito que sobrevive no Universo como um todo. E assim foi inventada uma força de repulsão cósmica, por vezes referida como “energia escura” ou “lambda”.

O caminho trilhado por este grupo de São Paulo, ao qual a noticia se refere, é diferente. Eles optam por revisar alguns conceitos sobre o que entendemos das Supernovas, dividindo-as em três populações distintas e, com isso, obtendo um resultado clássico: a aceleração está, de fato, diminuindo.

Resumindo: há dados conflitantes no modelo teórico do Universo. Se mantivermos certas hipóteses sobre as Supernovas, devemos admitir que o Universo se expande de forma acelerada. Mas se certas hipóteses astrofísicas forem reformuladas, chegamos à conclusão de que a expansão está diminuindo de velocidade.

Quem está certo nesta história? Não sabemos. Só o tempo e as pesquisas poderão dizer! (E, pior, pode ser que nenhuma das duas ideias seja a correta!)

Categories
Coluna do Astrônomo

Busca por universos paralelos é promissora

Comentário do Astrônomo Alexandre Cherman à “’Busca por universos paralelos é promissora’, segundo cientista”.

A palavra “Universo” surgiu provavelmente no começo do primeiro milênio. Foi cunhada a partir de um erro conceitual grave, porém corriqueiro. Acreditava-se, naquela época, que a Terra jazia imóvel no centro do Cosmos (um sinônimo de Universo, este termo tem origem grega e quer dizer “beleza, organização”). Assim sendo, a única maneira de explicar o movimento diurno dos objetos celestes, que hoje sabemos ser um movimento aparente causado pela rotação da Terra, era conferir a todos os astros um movimento em uníssono, com período de 24h.

Para os nossos antepassados, tudo o que havia no céu girava como um grande objeto, dando uma volta completa em 24 horas. Este “girar como uma coisa só”, em latim, é dito “unus verterem”, termo que acabou se corrompendo e deu origem à palavra “Universo”. Ou seja, o nascimento deste termo, “Universo”, partiu de uma idéia errada que tínhamos sobre o Cosmos.

Como definimos “Universo” nos dias atuais? Simples. Assustadoramente simples. Universo é “tudo o que existe”. A Cosmologia é um ramo da ciência que alia Física, Astronomia e Matemática para estudar o Cosmos, ou o Universo. Ou seja, a Cosmologia estuda TUDO O QUE EXISTE!!!!

Por isso mesmo eu não gosto do termo “universos paralelos”. Ora, se o Universo é TUDO, como pode haver um outro Universo, paralelo, ortogonal ou cor-de-rosa-com-bolinhas-roxas?!? Ao invés de “universos paralelos”, deveríamos estar usando o termo “partes desconhecidas do Universo” (afinal, o Universo é tudo o que existe…).

Não sou indiferente ao fato de que “universo paralelo” é bem mais sonoro e instigante do que “parte desconhecida do Universo”. Mas “universo paralelo”, do ponto de vista semântico, é um oximoro.

Independente disso, a notícia é muito estimulante. Estas partes desconhecidas do Universo existiriam independentes entre si, sem contato (daí o termo “paralelo”). A nossa parte não tem ligação com outras partes, e assim sucessivamente. Mas não têm ligação nos dias atuais. No passado, estas “bolhas isoladas” (partes desconexas do Universo) teriam se esbarrado e se interpenetrado. E tal como bolhas, teriam definido interseções que poderiam ser observadas ainda nos dias de hoje.

Mas por que a condicional? Ora, porque isso tudo é hipótese, mera especulação. A descoberta de alguns padrões circulares é interessante, mas desde já fica a ressalva: não há porque as “bolhas” serem perfeitamente circulares e, portanto, não há porque suas interseções, se é que elas existem, serem círculos.

Se a informação é um produto, aqui mais do que nunca vale a máxima latina: caveat emptor (o risco é do comprador).

E fica o convite para o leitor que se interessa pelo tema: o curso “Introdução à Cosmologia” acontecerá de 19 a 23 de setembro.

Categories
Coluna do Astrônomo Curiosidades

Qual é a cor do Sol?

Acho que 99% da população dirão, sem hesitar, que o Sol é amarelo. Será?

Como qualquer estrela, o Sol emite radiação em diferentes comprimentos de onda. No nosso dia a dia, isso pode ser traduzido como “várias cores”. Cada comprimento de onda equivale a uma cor diferente; inclusive as cores que não vemos.

Raios gama, os comprimentos mais curtos (e mais energéticos), por exemplo, são emanações do Sol que não vemos. Ondas de rádio (comprimentos longos, pouco energéticos) também.

O pico das emissões solares se situa na zona espectral que chamamos de “visível”. Na verdade, nossos olhos evoluíram desta maneira, privilegiando esta determinada faixa eletromagnética justamente porque é ela a principal emitida pelo Sol!

cor do sol

E, dentro da faixa espectral visível, onde está o pico de emissão? Na cor amarela, certamente… Errado! O pico de emissão solar varia muito pouco, e se situa entre 475 e 500 nanômetros (o que é um nanômetro? Pegue um metro e divida em um bilhão de pedacinhos; cada pedacinho desses tem um nanômetro de comprimento!). Essas medidas de comprimento de onda equivalem, respectivamente, ao azul e ao verde.

Nosso cérebro “mistura” essas informações e acabamos interpretando a cor do Sol como sendo amarela. Mas, na verdade, o Sol é verde-azulado, se fôssemos realmente definir uma cor para a sua superfície. Quem diria, hein?

Leia também:

Categories
Coluna do Astrônomo

Minhas conversas com Ísis

Para quem ainda não sabe, Ísis é minha filha. Fez três anos em novembro de 2010.

Outro dia eu a estava colocando para dormir e tivemos a seguinte conversa (repito, ela tem três anos e, portanto, eu devo ser algum tipo de monstro…):

ÍSIS: Papai, por que está escuro?

EU: Porque está de noite, filha.

ÍSIS: E por que está de noite?

EU: Por que a Terra gira ao redor dela mesma…

ÍSIS: E por que a Terra gira?

EU: Porque ela já nasceu girando. Ela continua girando e vai girar pra sempre.

ÍSIS: Por que a Terra não para?

EU: Por que no espaço não tem atrito, então o momento angular se conserva.

ÍSIS: Momento “lugar”?!? Papai é engraçado…

Depois disso, a conversa tomou outro rumo. Mas eu acho que ela já começou a entender…

Categories
Coluna do Astrônomo

Astronomia pelo Brasil

Tendo escrito sobre a minha já não tão recente visita ao Egito (para a conferência da International Planetarium Society) e da minha atual aventura em solo ianque (para a conferência da Great Lakes Planetarium Association), percebo que cometi duas injustiças que devem ser retificadas…

Em agosto estive em Rio Claro, interior de São Paulo, participando, como palestrante convidado, da Semana de Astronomia da UNESP. A UNESP não possui curso de Astronomia, nem tampouco um planetário. Mas tem um grupo abnegado de astrônomos amadores (Los Sombreros), formado por muitos de seus alunos, que é bastante atuante e empreendedor. E com persistência e amor pela ciência, esses meninos (já adultos, eu sei, mas meninos para mim, que já há muito deixei para trás meus tempos de faculdade) conseguiram montar uma bela e variada programação. Agradeço o convite e a bela recepção que tive por lá.

Um brinde aos Sombreros! E quem os conhece bem, e em particular o “título” nada honorífico que eles se autoimpuseram, sabe que eles apreciam um brinde. E, claro, o que vem logo depois disso.

Em outra viagem recente, fui ao Ceará. Como diretor da Associação Brasileira de Planetários e membro do comitê organizador do Ano Internacional da Astronomia no Brasil, eu havia sido convidado para a inauguração dos novos equipamentos do Planetário de Fortaleza. Não pude ir, pois estava no Egito. Mas fiquei frustrado pela oportunidade perdida.

Dermeval Carneiro, diretor do Planetário de lá e uma lenda viva da divulgação científica no Nordeste, conseguiu viabilizar minha ida em setembro passado. Em troca, dei duas palestras (“História do Calendário”, na cúpula reinaugurada, e “Teoria da Relatividade”, no auditório do Espaço Cultural Dragão do Mar).

Além disso, fui premiado com um bônus. Dermeval viabilizou minha ida a Sobral, onde conheci o Museu do Eclipse e o lendário sítio onde uma expedição inglesa, ao observar o eclipse solar de 1919, comprovou as previsões de Albert Einstein, corroborando sua Teoria da Relatividade Geral. Realizei um sonho antigo com essa visita a Sobral…

E é isso. Acho que esse ano não viajo mais…

Categories
Coluna do Astrônomo

Medo de escrever

Sempre quis ser escritor. Desde que me entendo por gente, sempre quis ser escritor. Já quis ser bombeiro, astronauta, policial, farmacêutico, espião, ator. Mas havia sempre um “e” em minhas afirmações. Era bombeiro e escritor; astronauta e escritor; etc. etc. etc.

Tornei-me astrônomo. E escritor. Hoje vejo que esta inusitada escolha profissional (astrônomo?!? Quantos astrônomos você conhece?) foi a grande facilitadora do meu sonho. Em uma sincronicidade feliz, formei-me no mesmo ano em que o Planetário expandia sua estrutura e lançava um edital público para um concurso com fins de contratar astrônomos. Sem nunca ter sequer sonhado em trabalhar no Planetário, fiz a prova e passei (passei no susto e na sorte, mas passei…).

Fui contratado antes de o prédio novo e sua cúpula ficarem prontos. Eu e todos os demais concursados. Precisávamos passar por um treinamento antes da inauguração. E durante o treinamento, o que fazer além dele? A equipe existente tocava muito bem o dia a dia da instituição. E eu, um novato até entre os novatos (saudades do tempo em que eu era o mais jovem da equipe… estou ficando velho…), estava aparentemente sem função clara.

Eis que cai em meu colo uma oportunidade e tanto, ao menos para mim. Havia a “Curiosidade do Mês”, um texto de divulgação em Astronomia publicado mensalmente no folder da Fundação Planetário. Os astrônomos se revezavam para escrevê-la. E em dezembro de 1997, menos de dois meses após minha contratação, fui informado de que eu seria responsável pela “Curiosidade do Mês” de fevereiro.

Lembro-me dela até hoje. Falava sobre o Carnaval e sobre o enredo de uma escola de samba, que fazia alusão ao Big Bang. Minha felicidade em fazer aquilo deve ter sido muito transparente, pois em seguida escrevi a de março, a de abril, a de maio… De maneira natural, o rodízio entre os astrônomos acabara e a “Curiosidade” tornou-se minha responsabilidade. Responsabilidade esta que mantive até novembro de 2005, o que me concede o recorde de maior número de “Curiosidades do Mês” escritas por um astrônomo da Fundação Planetário.

Mas esse texto não é sobre mim (apesar de parecer o contrário…). A tarefa que me foi passada em dezembro de 1997, colocou-me em contato com uma pessoa que veio a se tornar uma das minhas melhores amigas e, certamente, minha maior colaboradora profissional. Angela Almeida, assessora do Diretor de Astronomia, formada em Letras, revisora de todos os textos que produzíamos. (A ironia de seu nome proparoxítono ser grafado sem acento nunca nos escapou…)

Tudo o que eu escrevi para o Planetário, desde então, passou pelo crivo da Angela. Se tenho fama de escrever bem, o mérito é dela. E, aparentemente, esta fama existe! Para minha grande felicidade, as pessoas têm gostado do que eu tenho escrito nesses últimos 13 anos. As curiosidades abriram as portas para o meu primeiro livro, publicado pela Fundação Planetário; e este primeiro livro me abriu as portas de uma editora comercial, que já publicou outros três livros de minha autoria. Hoje sou um autor publicado. É um sonho realizado. E uma parte disso eu devo à Angela.

Depois de anos e anos de trabalho, Angela se aposenta mês que vem. Mas já está de férias por agora, de modo que não posso mais contar com ela no meu cotidiano. Minha revisora me abandonou (a amiga vai ficar para sempre!).

Aos leitores de meus livros, fiquem tranquilos. Eles continuarão sendo revisados, por conta da minha editora. Mas meus textos do Planetário… ainda não achamos uma solução para a ausência da Angela. Aos meus leitores destas paragens, caveat lector. Os erros serão inevitáveis. Fiquei muito mal acostumado com a mão segura da Angela…

Acho até que estou com medo de escrever…

Categories
Coluna do Astrônomo

A Relatividade à beira da Piscina

Quando Einstein concluiu sua Teoria da Relatividade, em 1915, ficou comprovado que o tempo (assim como o espaço) é relativo. Einstein costumava brincar dizendo que um minuto ao lado de uma bela mulher passa muito mais rápido do que um minuto segurando uma panela quente.

Certamente, era uma brincadeira (um tanto machista, diga-se de passagem). O que Einstein descreve nesse exemplo é o tempo subjetivo, e não o tempo relativo. A percepção do tempo não tem nada a ver com a Teoria da Relatividade, que nos diz justamente o contrário: há métodos seguros e precisos para medirmos o tempo, que é relativo, e que não dependem de nossas percepções.

Mas é o tempo subjetivo que mais nos afeta e é a ele que estamos atrelados. Pois bem: Ísis (minha filha, com quase três anos de idade) fez ontem sua primeira aula de natação sem fralda. Foram trinta minutos tensos, comigo aflito, por perto, esperando por um “acidente” a qualquer momento.

No final, deu tudo certo. Mas como demoraram para passar aqueles trinta minutos!

Tempo subjetivo…

Categories
Coluna do Astrônomo

Congresso da GLPA

Cá estou, em Mishawaka, estado de Indiana, norte dos EUA. Dois graus centígrados lá fora, uma noite linda e gelada, encerrando as atividades deste segundo dia do congresso da GLPA.

A GLPA (Great Lakes Planetarium Association) é a mais antiga associação de planetários do mundo; foram seus membros que deram origem à International Planetarium Society (IPS). Sua reunião anual é a segunda maior conferência de planetários do mundo (só perde mesmo para a da IPS).

E apesar de já ter ido a quatro reuniões da IPS, fiquei nervoso em minha estreia na GLPA.

Na IPS, a graça toda é conhecer gente nova de lugares exóticos (sim, o Brasil é um lugar exótico aos olhos dos povos do norte…). Aqui, não. Aqui o clima se parece muito com as reuniões da Associação Brasileira de Planetários (ABP). Aqui, a graça é rever os amigos!

Logo de cara eu me senti como aquele menino que chega a uma escola nova em seu primeiro dia… Todo mundo se conhece e você não conhece ninguém. Por sorte, eu tenho alguns amigos aqui, que conheci nas reuniões da IPS, então essa sensação não durou muito tempo.

E o que eu estou fazendo aqui, afinal? Moro no Rio, a uns 8.000km de qualquer um dos Grandes Lagos. Bem… vim como convidado. Na última conferência da IPS (no Egito), tive a honra de ser indicado para concorrer a presidente. E logo algumas pessoas me alertaram: “você precisa ir à reunião da GLPA. Foi lá que tudo começou. Não deixe de ir!”

Bem, isso não estava nos meus planos. Nem nos planos do Planetário. Não havia verba para a viagem, simplesmente porque ela jamais fora prevista quando planejamos o orçamento. Mas um convite desses não acontece todos os dias e acabei vindo, por conta própria. O Planetário me apoiou, me liberando por uma semana.

E cá estou, conhecendo pessoas, aprendendo coisas, batalhando pela candidatura (não a minha, mas a candidatura do Rio para sede da conferência da IPS 2014). Gostei muito do que vi por aqui.

Quem sabe eles não me convidam de novo no ano que vem?…

Categories
Coluna do Astrônomo

Pontos Cardeais

Da série “Tolerância Zero”…

Leio, em uma grande revista semanal, que o serviço do GoogleMaps que disponibiliza fotos das ruas de algumas cidades já está funcionando no Brasil. Na reportagem, é explicado como funciona a captura das imagens. Ali é dito que um carro possui nove câmeras; uma está voltada para o alto e as outras oito, uma para cada ponto cardeal.

Oito pontos cardeais? Como assim?

Há apenas quatro pontos cardeais! Norte, sul, leste e oeste. Entre o norte e o leste, temos o nordeste. Mas o nordeste não é um ponto cardeal. É um ponto colateral. Assim como são pontos colaterais o sudeste, o sudoeste e o noroeste.

Será que era isso que a reportagem queria dizer? Que as oito câmeras apontam para os pontos cardeais e colaterais? Ou será que cada ponto cardeal tem duas câmeras apontadas para si, permitindo a captura de imagens estereoscópicas para a visualização tridimensional? Não sei…

Em tempo: cardeal vem de “coração”, em reconhecimento à importância desses pontos que, no melhor clima “tolerância zero”, não são pontos coisa nenhuma, e sim direções! Mas isso já é outro papo…

Categories
Coluna do Astrônomo

Fusos Horários

Acho que comecei uma série neste blog, ainda que involuntária. Vou chamá-la de “Tolerância Zero”, em uma homenagem a um antigo quadro humorístico protagonizado pelo saudoso Francisco Milani.

Já reclamei sobre vários usos indevidos de expressões astronômicas e científicas (a mais recente foi o “sol a pino”). Pois volto às minhas reclamações…

Era a cobertura jornalística das últimas eleições – um show de jornalismo, diga-se de passagem –, quando o locutor, do Rio, chama a repórter, em Mato Grosso do Sul. Ela diz: “Aqui no Mato Grosso do Sul as eleições ainda não terminaram, pois temos fuso horário…”

Como assim? Aqui no Rio também temos fuso horário! Que eu saiba, não há lugar na Terra que não tenha fuso horário!

Certo, certo. Todos sabemos o que ela quis dizer. Ela quis dizer que o fuso do Mato Grosso do Sul é diferente do fuso do Rio. Sim, foi isso o que ela quis dizer. Mas não foi isso que ela disse! Grande diferença.

Os fusos horários são uma invenção humana e, podemos dizer, uma arbitrariedade. Na China, por exemplo, o segundo maior país do planeta, há apenas um fuso horário! Isso é um absurdo geográfico, mas como os fusos são arbitrários, o governo chinês decidiu que todos deveriam seguir a hora de Pequim.

Uma arbitrariedade mais respeitosa é o que se costuma fazer, considerando-se o fato de que cada quinze graus de longitude deve corresponder a uma faixa de fuso horário. Mas como definir uma origem para esse sistema?

A superfície da Terra é bidimensional, o que significa dizer que para localizarmos qualquer ponto sobre ela precisamos de um conjunto de dois números, chamados “coordenadas”. As coordenadas oficiais são a latitude e a longitude. Ora, se temos duas coordenadas, precisamos de duas linhas de base, dois “zeros”. O zero da latitude é fácil de encontrar, pois o movimento da Terra define um eixo imaginário e este eixo, por sua vez, define um círculo que divide a Terra em duas metades iguais (este círculo é o Equador).

É importante entender que qualquer círculo máximo divide a Terra em dois hemisférios, mas apenas o Equador se localiza no plano que está a noventa graus do eixo de rotação da Terra. A Natureza nos deu uma linha de base. Mas a outra, precisamos criar…

Há infinitos círculos máximos passando sobre a Terra. Dentre estes, há uma classe especial que são aqueles que cruzam o Equador de forma ortogonal (perpendicular). Este subconjunto, também com infinitos elementos, é formado pelos meridianos terrestres. Respeitando uma convenção antiga de que os eixos de um sistema de coordenadas devem ser, preferencialmente, perpendiculares, qualquer um dos meridianos terrestres seria uma boa linha de base para construirmos a longitude.

Mas se qualquer meridiano poderia ser usado, por que usar o de Greenwich?

Bom, poderíamos simplesmente dar de ombros e retrucar: por que não? Mas há uma razão, como descrita na Curiosidade do Mês de junho de 2000, publicada no folder da Fundação Planetário:

A maior potência do final do século XIX era, sem sombra de dúvidas, a Inglaterra. “O Sol nunca se põe no Império Britânico”, dizia-se na época. E como uma forma de manter coeso este vasto território, a Inglaterra investiu em tecnologia e conhecimento.

De cada quatro mapas da época, três eram de origem inglesa. Desenhados a partir dos dados obtidos pela Marinha britânica, estes mapas, já havia muito tempo, usavam a longitude do Observatório Real de Greenwich como marco zero.

Mas havia mapas feitos na França que usavam o meridiano de Paris como marco zero; e mapas russos que usavam o meridiano de Moscou e assim por diante. Com o crescimento do intercâmbio entre os países, ainda no século XIX, pensou-se que deveria haver uma unificação. Em 1884, houve uma reunião em Washington, EUA, onde 41 delegados representando 25 países finalmente colocaram um fim à confusão cartográfica. Como a maioria dos mapas já usava o meridiano de Greenwich, optou-se por torná-lo, oficialmente, o meridiano zero da Terra. Continuando a citar a Curiosidade do Mês: “Luis Cruls, astrônomo belga radicado no Brasil, declara o voto brasileiro: abstenção. A França também se abstém, e o pequeno San Domingos vota em Paris. Todos os demais países representados escolhem Greenwich. Estava criado o meridiano zero de nosso planeta (e, como consequência disso, nascia também o sistema de fusos horários que usamos até hoje).”
 
No século XIX, como nos dias de hoje, conhecimento era poder.